Ituiutaba, sábado, 23 de novembro de 2024

Não vão tirar de mim a minha história, messias!

Publicado por Vigilante do Povo em 17/01/2020 às 16:58

O Brasil é um país atrasado. Aqui paira a ignorância e falta de comunicação. Mais de 3mil municípios brasileiros não possuem nenhum órgão de comunicação e sobrevivem da vassalagem de quem tem o melhor sistema de alcance: a Rede Globo.

Mais de 3 mil municípios sem um jornal impresso ou um site local. Criada nos tempos da ditadura e defensora implacável regime, se alimentou dos restos ou do bolo inteiro dos despejos do milagre econômico de Emília Garrastazu Médici e Delfim Neto, ampliação da desigualdade social e a caça dos resistentes.

Foram conhecidos como os anos de ferro do regime, seguidos pelo evangélico Ernesto Geisel.

Tem uma moçada doida que diz que nada existiu. Eu me pergunto como não? Eu vivi esse tempo, cresci nesse tempo e “comemorei” a cada ano na escola, juntos de centenas de crianças miseráveis e famintas, maltrapilhas, no barro e no cascalho seco do Bairro Ipiranga, obra da massificação militar, com escandalosos desvios de verbas, o 31 de março.

Tem imbecil que, na doideira da Terra plana, que eu esqueça minha infância e minha adolescência.

Poxa, cara, eu vi a fome de perto e ela estava viva!

O Bairro Ipiranga foi essa experiência bem sucedida de tirar das vistas dos ricos, nós, degredados filhos de Eva, para o desterro que ficava no meio de uma chácara, de onde, ao longe, víamos as luzes da cidade.

Existia uma favela, este é nome verdadeiro sem passar os panos, no alto das fazendas que nos cercavam. Vilas de colonos sem água potável ou saneamento básico. Gente que vivia do trabalho sazonal das colheitas do arroz e depois do algodão.

Construíram a escola no Ipiranga, no maior projeto de massificação e doutrinação da história brasileira. Era como todas iguais em arquitetura e projeto. Da mesma cor. Tijolos alaranjados à vida. Ali se tornou o local de ensinar obediência, servidão pacífica e mostravam outra versão da História do Brasil.

Fomos lançados nos ensinos iniciais em Moral e Cívica. Pés no chão, sem cadernos ou livros, lápis, os pais eram obrigados a comprar. Se não tínhamos sentávamos com o coleguinha. Da quinta série em diante tínhamos um sargento nos ensinando OSPB (Organização Social e Política Brasileira). E os resquícios dessa miserabilidade, eu ainda encontrei na Faculdade de Letras, com EPB (Estudos dos Problemas Brasileiros).

Por isso, quando ouço que temos um presidente e ministros que seguem um astrólogo de mentirinha, que diz que a terra é plana e que cigarro não mata, acredita em comunismo, que a ditadura brasileira não existiu, fico pensando que alguém quer mudar a história da minha vida!

Foram tempos de fome, repressão, corrupção em níveis magistrais e de medo. Mesmo aqui nesses confins do nada que éramos.

Passávamos fome em silêncio. Comíamos o que a natureza ofertava ou o que plantávamos e criávamos. Separaram-nos do resto da sociedade, como fazem com aquilo que não desejavam ver. Pobre, sujo, descalço, sem vacinação, cheio de doenças, lombrigas e sem acesso digno a nada que fosse digno.

Por isso, nenhum presidente Messias, nenhum doido Olavo, nenhum ministro riquinho com suas teorias de pactos satânicos vai recontar a MINHA HISTÓRIA.

Eu estou vida e sobrevivi ao sarampo, catapora, coqueluche, pneumonias, poliomielite, meningite, tifo e caxumba. Sobrevivi aos vermes e aos vermes.

Todo esse sofrimento me deu força e me fortaleceu. Eu não conhecia Friedrich Wilhelm Nietzsche, porém descobri que uma de suas máximas, serviu em mim como perfeitamente: o que não me matou me fortaleceu. E eu respiro ainda, apear das estatísticas, para dizer: ditadores nunca mais.

Vamos em frente para diminuir a desinformação e a falta de comunicação. E, sim, por democracia e direitos, não apenas como uma cortina de fumaça que mantém, mesmo na democracia, uma desigualdade brutal e assassina.

Por Geiza Ardila